sexta-feira, 27 de novembro de 2020

CONFESSO QUE PERDI, DE JK – Por Dorival Valente


Faz uns três meses que terminei de ler o livro Confesso Que Perdi, do Juca Kfouri. Desde então queria escrever sobre ele, mas havia algo em mim que não conseguia traduzir. Nem sei se agora já sou um bom tradutor de mim. Contudo, entendo um pouco mais do que sinto.


Um ou dois anos antes de falecer, Carlos Heitor Cony disse em uma entrevista (não lembro para quem) que  sentia uma solidão causada pela ausência dos velhos amigos. Não que fosse um solitário. O fato é que todos os seus amigos eram “novos”. As pessoas que o cercavam não viveram com ele a maioria das histórias da sua vida.

A solidão das lembranças é cruel!

Algumas vezes, isto deve acontecer com todos, lembro de fatos passados de forma tão nítida que até parece que aconteceram hoje de manhã. Quando converso com alguém, que estava comigo quando o ocorrido ocorreu, e a pessoa não lembra de nada daquilo, desperto para uma solidão de ser o único que ainda vive aquilo. Talvez seja isso que o Cony sentia.

Esta semana morreu o Maradona. Ouvi uma declaração do Messi. O que ele disse, para este texto, não importa. Tentei imaginar o que diriam os jornais quando o Messi fosse o elemento sem vida. De repente percebi que, provavelmente, eu já estarei morto quando o fato imaginado ocorresse.

Sei que agora você (seja lá quem for) deve ter pensado que ninguém garante quem irá primeiro ou depois nessas questões mortíferas. Não é esta questão. O assunto aqui é a expectativa de tempo vivo.

Quando somos novos temos a pretensão de tempo vivo maior que todos nossos ídolos, exemplos, inimigos, contratempos. Assim que começamos a admirar pessoas mais novas, nasce um algo incômodo intraduzível e engasgante, uma casquinha de pipoca na garganta que a água não leva.

Chega um momento em que os atores da nossa vida se tornam apenas histórias. Não falo exclusivamente dos famosos, mas de todos: parentes, amigos, desagrados, conhecidos, vistos.

                                                           

A crueldade de 2020, sem dúvidas, ficará marcada nas anotações históricas. Porém, essa angústia que sentimos se perderá quando o último humano contemporâneo, ciente do que se passa, morrer.

Quando Juca Kfouri confessa que perdeu, na verdade, ele protege suas memórias jornalísticas para que elas não sumam com a sua futura morte (se é que um dia ele morrerá!).

Como uma pessoa de sucesso pode acreditar que perdeu?

Eu não sei o que ele pensou! Eu não sei o que os outros pensam!

Eu sei traduzir, para mim, o que li. Não quero dizer que essa tão particular tradução seja “A Verdade”.

O livro conta histórias saborosas e curiosas. Ele sabe lembrar e escrever. Dizem que é jornalista, mas escreve como colunista, cronista ou, tempos modernos, como blogueiro. Assim é o livro: notícias com um viés pessoal.

Durante a leitura do livro do Kfouri, tentei entender o que ele perdeu.

Já publiquei 6 livros

Quando eu estava com 10 anos comecei a escrever poesias, letras de música e alguma estória. Comentei ao meu irmão Nestor (já falecido) a intenção de escrever um livro. Ele riu bastante e perguntou o que é que eu sabia da vida, ou o que eu vivi para escrever um livro. Essa lembrança ainda me perturba, é claro!

Em um Natal dos anos 70, ganhei um jogo inspirado no programa do Sílvio Santos "Só Compra Quem Tem". Para este texto vou adaptar o nome do jogo para “Só Perde Quem Tem”!

Só perde a memória, quem tem memórias para perder.  Pelo visto, o Juca ainda traz guardado num quintal dentro de si (como cantou Belchior) muitas lembranças. Algumas ele as perdeu em um livro para que elas não sejam mais apenas dele.

Se houver tempo, leia Confesso Que Perdi, do Juca Kfouri.

sexta-feira, 17 de julho de 2020

QUANDO DESCOBRI QUE ERA MENINA




O que é isto que você está lendo? Uma crônica? Uma matéria jornalística? Uma resenha? Uma crítica? Um comentário? Apenas um texto?
Eu, como autor, tenho a MINHA definição; que ficará guardada para mim.
É necessário que, depois da leitura, você faça seu próprio julgamento e crie a sua opinião.
 Talvez até você sequer pense nisso. Qual é a importância de definir como classificar este amontoado de palavras? Sinceramente, nenhuma.

Contudo, em certos momentos da vida, querendo ou não, descobrimos algumas definições muito importantes, que podem justificar, explicar ou orientar os rumos que seguimos ou seguiremos na nossa caminhada.
Quando foi que isso aconteceu com você?
Qual o momento da descoberta de um fato importante que te ajuda entender a sua forma de se relacionar com as outras pessoas e com o mundo?
Eu lembro da primeira poesia que me veio. O susto e a emoção de me sentir capaz de produzir versos. Aconteceu em uma tarde de agosto de 1976... Eu não estou aqui para falar de mim! Essa história conto depois... ou nunca...
A intenção deste texto é falar sobre um livro construído de uma forma bem interessante.
Nove ilustradoras, “de traços e vivências variadas” , trocaram histórias sobre um momento especial pelo qual todas passaram. Quem recebeu o escrito ficou incumbida de ilustrar aquela narrativa. Assim nasceu
QUANDO DESCOBRI QUE ERA MENINA

O livro narra nove episódios de tomada de consciência de que não existem regras pré-determinadas, rígidas, engessadas, que cada pessoa é obrigada a seguir para viver. Sejamos livres para ser o que somos. É possível ignorar os rótulos, principalmente se eles não lhe cabem bem.

Livro produzido com apoio de muitos, pelo Catarse. É sempre bom saber que ainda há que apoie a produção de arte.

Fazendo jus à intenção do livro, as ilustrações não estão presas em molduras. Ocupam os espaços que querem, ultrapassam os limites das páginas e seguem nas infinitas possibilidades da imaginação.
Histórias curiosas, engraçadas, motivacionais, instigantes e instrutivas.
Não é um livro apenas para meninas. Meninos também podem deitar os olhos sobre essas páginas. Eles, os meninos, também precisam se descobrir. Aliás todas as pessoas, para que a vida siga com menos traumas ou tragédias, necessitam compreender a difícil simplicidade de se entender, e se aceitar, como é.

Conheço uma das autoras, Carolina Trezena. Ela fez a capa de um livro meu e dos meus amigos, Verso É Prosa.

Para a Carolina (e estendo para todas as autoras/ilustradoras do livro) fiz o que um dia eu descobri que gosto de fazer:

                                                                       REFLEXO

A menina
Os espelhos
Que não refletem
A menina
Fez-se livro
Para refletir
                                                              Dorival Valente

Ficou interessado no livro? Entre em contato com a Carolina Trezena